Conto

Última vez

dezembro 19, 2024 · Pedro K. Calheiros

Em nosso íntimo, sabíamos que não haveria um depois; uma música entoava as coisas num tom de despedida e, ignorando o sentimento atroz, os dois fizeram amor pela última vez.

Com algum remorso e, em certo grau, luto, arrumaram a bagunça em silêncio. As camisinhas usadas foram recolhidas e os brinquedos eróticos, guardados. O gemido que ecoava há pouco tempo agora dava vazão a um som bem maior que os dois poderiam suportar: o silêncio.

As palavras não ditas foram acumulando e, num dado momento, já não havia mais nada a ser dito devido ao tanto que ficou por dizer.

Já não se reconheciam mais e tudo soava protocolar. Ainda havia amor ou apenas um sentimento de negação diante do império ruído? Katarine não queria acreditar no fim; Douglas, tampouco. Ainda havia algo a ser feito ou o que os impedia de seguir em frente era a sensação de quase morte ao imaginar o seu amor nos braços de outro alguém?

Beatriz fechou o livro – já estava tarde. O vento frio começa a invadir o apartamento e o café, que havia feito mais cedo, já havia esfriado. Ah, a literatura… Sempre nos tirando de órbita de um jeito gostoso e único, ela pensou, entusiasmada.