Crônica

É preciso ser firme e forte

julho 17, 2022 · Pedro K. Calheiros

No dia em que meu pai foi embora (para os espíritas, desencarnou), uma voz ecoou em minha mente e dizia: é preciso ser firme e forte. Antes do anúncio oficial, algo já me alertava sobre uma viagem que eu ia precisar fazer. Ora, que viagem teria de fazer, se não para levar o meu pai de volta à sua cidade natal, Itacoatiara?

Não dormi, é óbvio. Recebi a notícia por volta das 21h, e fiquei em choque, mas não surpreso. O hospital, como de praxe, ligou pedindo por documentos. Em casa, conversando com os amigos do meu pai, que coordenaram tudo, fiquei responsável por fazer o anúncio oficial. Foi difícil escrever a nota; afinal, como falar da morte de alguém tão importante para mim? Alguém que me deu a vida, alguém que, dentro das suas limitações, foi o melhor pai que conseguiu ser.

Foi tudo mecânico. Escrevi tudo e, alguns segundos depois, já era pública a notícia da partida de Francisco Calheiros. Poeta, escritor, advogado e o melhor pai que a vida poderia ter me dado. Veículos como A Crítica e G1 noticiaram a sua partida, tamanha a sua relevância. Não sei; ainda me custa acreditar que não haverá mais almoço, passeios aleatórios e as nossas conversas sobre a vida, em que, imersos num mundo só nosso, éramos capazes de nos entender muitas vezes sem precisar falar nada.

Pai, não sei se foi o senhor que enviou a mensagem, mas estou sendo firme e forte, sim. Afinal, é preciso ser. Lembra que sempre dizia em sala que queria ser esquecido? “Quando eu morrer, quero que todo mundo me esqueça. Ninguém vai lembrar de mim.” Perdoe-me, mas não vai rolar, não. A sua memória está registrada para toda a eternidade com tinta indelével, e o seu legado jamais vai ser esquecido.

Afinal, não é qualquer um que entra numa sala de aula e dá o show que o senhor costumava dar. Olhar nos livros e copiar no quadro? Ora, pra quê? Confesso que, depois do padrão de aula Calheiros, é muito difícil me contentar com alguns pseudoeducadores que se limitam a dar aula usando slide e, quando perguntamos algo, ainda se atrevem a ir ao slide em questão para dar uma espiadinha.

Poucos, como o senhor, entram em uma sala de aula com um pincel e fazem tudo o que tem que ser feito. Enfim, nem todos são um Calheiros. A educação amazonense, como eu, sente a sua falta. Mas fica tranquilo: ouvi dizer que vamos nos encontrar em breve.