Publicações

Escultura inacabada

A escultura de Lego que não tivemos tempo de montar é metafórica; a expectativa de uma construção que as circunstâncias nos deixaram sem a imagem do fim. Hoje a minha poética amanhece triste. O Sol, que antes incendiava a minha alma, esfriou.  Uma estranha melancolia me visitou antes da tua chegada; algo no meu peito […]

Entre a névoa e o Sol

Não é preciso recorrer às cartas para saber o que alguém sente; o coração se desnuda nos gestos, no silêncio, na presença ou ausência. A vida é clara como um rio em manhã de sol, mas insistimos em turvá-la, jogando pedras de dúvida e criando ondas desnecessárias. No fim, tudo é simples: as coisas apenas […]

Apartamento

Hoje eu coloquei um vaso grandão na sala de estar. Enquanto passava o aspirador de pó no apartamento, uma música tocava no fone de ouvido; por alguns instantes eu estava imerso num mundo só meu. Tomei café da manhã sem pressa. Bolinhos de um peixe amazônico cujo nome não me lembro foram a entrada; depois, […]

Sinais de fogo

Há encontros que se anunciam como labaredas. Não vêm com hora marcada, mas deixam no corpo a sensação de queimar antes mesmo de acontecer. Basta um olhar e já não há distância possível entre o gesto e a lembrança. É como se o mundo inteiro conspirasse para acender em nós um incêndio antigo, desses que […]

Quatro de paus

Quando a névoa, enfim, se dissolveu no espaço; um lindo jardim ganhou forma com lírios, tulipas e girassóis. A tempestade se transmutou em poesia quando o contraste do segundo Sol iluminou a todos sem qualquer cerimônia. O olhar dela era o que meu coração, bobo, precisava; e, cá entre nós, o que seria da minha […]

Visita

A saudade foi mais aguda nas lacunas do dia que costumavam ser preenchidas com o som da tua voz. A vida seguiu, me distraí, e o que restou de nós se perdeu nas memórias que deixei de cultivar.  Até que num dia qualquer, a abrir um livro, voa no meu colo um bilhete teu; mania […]

Telefonema clandestino

O telefone é atendido no primeiro toque. — A sua inércia é uma escolha.— Mas eu te disse que…— Você já escolheu.— Não entendo o que quer dizer… Você sabe que não é tão simples.— As coisas são como são. Não pinte com lápis de cor.— E agora?— O de sempre; transformar o caos em […]

Démodé

Haverá um dia em que a minha escrita, imersa num mundo só dela, deixará de permear os temas comuns ao miocárdio. O subterfúgio será outro e o leitor, embebido da novidade, achará que está lendo o autor errado. O existencialismo, quem sabe, vire matéria prima para meus chistes. Os leitores mais românticos que me perdoem, […]

Pesquisa de campo

Saí de casa movido mais por curiosidade do que por qualquer intenção concreta. Não era noite de caçar histórias prontas, mas de garimpar matéria-prima, sentir o pulso da noite, registrar mentalmente gestos e olhares como quem sublinha passagens num livro alheio. Acabei na Rox, uma dessas baladinhas que tentam vestir um ar cosmopolita, mas ainda […]

Segundo Sol

O par de brincos sob a escrivaninha me lembrou uma música da Duda Raposo. A luz indireta do abajur, a iluminar uma pedra branca, traz um ar dramático à cena. Parece que cada detalhe ao meu redor carrega um significado.  A caneta, à espreita, aguarda a epifania. Se a pena soubesse como andam as alamedas […]

Quando o congelador virou relicário

Hoje cedo, enquanto misturava leite em pó com farinha láctea, me peguei pensando em ti. É engraçado como certas lembranças se escondem nas coisas mais simples. Concluí, sem querer concluir, que viramos isso: dois desconhecidos que sabem demais um do outro. Existe essa fantasia boba de retorno, como se revisitar o mesmo lugar trouxesse de […]