Espiritismo

Melancolia

novembro 2, 2025 · Pedro K. Calheiros

A melancolia que agora me invade é saudade. Não aquela saudade mansa e dolorida de um antigo amor que por muito tempo habitou a minha literatura, mas, sim, saudades de casa. Lá, a liberdade é plena e a fluição, uma constante – não um lapso, tampouco uma brisa que invade o nosso rosto num dia de calor. Cá, diante das intempéries que albergam a humanidade, sinto ojeriza – e tudo me parece pequeno, tudo me parece fugaz. Quero respirar as galerias de arte, quero habitar e reencontrar as infindas formas que criei. Ao recuperar os sentidos após o regresso, reencontrarei todos os homens que fui e, em uníssono, ecoarei todos eles dentro de mim.

Por ora, ficarei só – tentarei me harmonizar com uma prece, uma música ou um pensamento bom. Que os Espíritos que me guiam me enviem uma brisa repentina; qualquer coisa que me sirva de lembrete de que não estou só, um sinal ou outro de que estou no caminho certo, uma epifania que seja, a tecer algo que nem a minha mais refinada literatura seria capaz de traduzir em palavras. Diante da limitação que sustenta a nossa existência pretérita, algumas ideias nos são inconcebíveis, tal qual a ideia de um iPhone seria loucura nos anos 1980. Quero, se assim for permitido, me elevar às esferas onde a arte é mais pura, onde me embebedarei de fluidos dos quais a descrição sequer consigo fazer.

Guardarei comigo tudo o que me for experienciado e, como quem registra a viagem num diário, transformarei tudo em literatura. O leitor, confuso, talvez não entenda – o amigo e leitor espírita, caso pouse os olhos sobre as linhas, entenderá o que digo como quem dialoga consigo mesmo, e a compreensão se faz plena. Quantos hiatos cabem na interseção entre os dois mundos? Tais lacunas, quando reduzidas, representarão alguma espécie de retorno satisfatório para a humanidade? A minha escrita, embebida de algo maior, terá um tom diferente – e eu, sem entender como, acabarei por ser o primeiro leitor da minha própria história.